Do outro lado… (4) Até a ficha cair
Em um mês pode-se viver anos e amadurecer uma vida inteira. Durante o tempo que fiquei zanzando de um lado pra outro, do corredor para a capela, da capela pra sala de espera, comecei a pensar nos acontecimentos dos últimos dias e consegui identificar pelo menos quatro estágios até que a ficha caísse:
I – NÃO ACREDITO: num primeiro momento, nossa consciência insiste em não acreditar. Sim, porque a gente pensa que pode acontecer com todo mundo, menos com alguém do nosso meio.
II – MILAGRE: tudo bem, é isso mesmo… mas não tem problema, já, já, vai acontecer um milagre… Deus vai atender às preces minhas e de todas as pessoas que estão orando por ele. Afinal, para Deus nada é impossível, agora ele vai mostrar realmente que gosta de mim e do meu filho e vai fazer isso parecer que foi apenas um pequeno pesadelo.
III – REVOLTA: os dias passam, as coisas complicam, e daí você se revolta e se desespera ao mesmo tempo. Agora você passa a questionar porque Deus não faz nada. Fui evangelizada na religião católica apostólica romana e, é claro, minha revolta foi contra Jesus. Na capela do hospital tinha um grande crucifixo. Era lá que eu pedia e também reclamava:
– Pôxa, eu ensinei e cuidei de tantos adolescentes e jovens (era professora), levei pra viajar, tratei como se fossem meus filhos, por que você não cuidou do meu e deixou isso acontecer? A gente não merece…
Foram dias e dias de muita discussão entre Deus e eu. Às vezes eu ia numa igreja ali perto, onde tinha uma estátua de Nossa Senhora das Graças, e pedia a ela que, como mãe, me ajudasse (depois mandei construir em minha casa uma gruta em sua homenagem). A gente tinha que entrar num acordo.
IV – ACEITAÇÃO: quando me despojei da descrença, da ilusão, da revolta, encontrei a paz. A paz para aceitar e, com o ânimo que restava, refazer a vida da melhor forma possível. Esta fase ainda estou vivendo e vai continuar até que eu me vá. O segredo de ser feliz não é ter tudo como você quer, mas aceitar as coisas como são e, é claro, lutando para melhorá-las cada vez mais. Condicionar a felicidade a uma situação da qual não temos controle é pedir para ser infeliz, triste, desesperado, insatisfeito…
Final de maio, Nickolas foi liberado do hospital. Estava fraco, magro, esquelético e com a imunidade muito baixa. Voltamos pra casa e ele ficou aos nossos cuidados. Neste caso, quanto mais gente, mais risco. As visitas eram muitas e eu ouvi uma pessoa dizer que o tínhamos trazido para “morrer em casa”.
Virei onça! Não deixei mais ninguém entrar no quarto. Aí me chamaram de grossa, que eu não queria que vissem meu filho, e patati, patatá…
Ah, mas o que eu estava fazendo era para defender a cria.
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Tudo exatamente assim, não sou mãe, mas sou noiva e me deparei com tudo isso acima descrito!
Camylla, é certo que quem está do outro lado tambem tem suas recaídas. A diferença é que estamos fortalecidos com a experiência que tivemos. Bjo.
Muito legal a sua matéria, também passei pelos mesmo estágios, diria assim que de inferno Dantesco, passou a saga Herculana, onde os monstros da Terra, em primeiro preconceito, depois as escadas, buracos, mal uso das verbas públicas efim..
Me chamo Thiago e gostaria que desse uma olhada nesse evento, se possível, mesmo em cima da hora..dar uma enfase nesse evento.
http://www.sjp.pr.gov.br/portal/noticia.php?id=1274391452865960
ou pode googlear com a seguinte chave 1º Rally deficiênte físico em SJP.
Quem sabe o próximo não seja um salto de paraquedas não?
Ps – li a matéria sobre a cadeira de rodas, sinto também que puxo 20 elefantes, 4 leões, 2 zebras e um texugo manco…eis a minha pergunta.
Eu dirijo, gostaria de eu mesmo levar a cadeira de rodas no banco do passageiro enfim a dúvida é devo eu comprar uma cadeira que fexa em x em L? qual me facilitaria a vida?
Desde já agradeço, espero que me aceitem na comunidade… gosto de partilhar ..
Abraços
Att Thiago
Thiago, sugiro que vc participe da nossa comunidade no orkut para trocar ideias com outros cadeirantes sobre a cadeira que melhor lhe convém:
http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=39710435
Thiago, realmente, se vai do inferno ao céu muitas vezes. Tem tempo que até hibernamos um pouco no purgatório. Mas nada que nos tire o valor de viver. Abraço.
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